domingo, 6 de maio de 2012

Quando há muitos anos só te tenho em mim





Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!
Eu ainda não fiz viagens e a minha cabeça não se lembra senão de viagens! Eu vou viajar. Tenho sede! Eu prometo saber viajar!
Quando voltar, é para subir os degraus da tua casa, um por um. Eu vou aprender de cor os degraus da nossa casa. Depois venho sentar-me a teu lado. Tu a coseres e eu a contar-te as minhas viagens, aquelas que eu viajei tão parecidas com as que não viajei, escritas ambas com as mesmas palavras. Mãe! Ata as tuas mãos às minhas e dá um nó cego muito apertado! Eu quero ser qualquer coisa da nossa casa. Como a mesa. Eu também quero ter um feitio que sirva exactamente para a nossa casa, como a mesa.
Mãe! Passa a tua mão pela minha cabeça!

Quando passas a tua mão na minha cabeça, é tudo tão verdade!

(A Invenção do Dia Claro, de Almada Negreiros, INCM)

4 comentários:

jrd disse...

(...)Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim (...)
Eugénio de Andrade

...e a saudade feita de esperança em dias melhores.

Abraço

Ad astra disse...

Palavras para quê

Mar Arável disse...

Do ventre

até à foz

Manuel Veiga disse...

dói. de tão belo e suave...

ainda hoje sinto os dedos acariciando a cabeça.

beijo